08/07/2012

02.Paris__________________________________________{BANG@!}

Perguntei prum taxista onde eu poderia comprar cd's nessa cidade e ele me olhou torto. Disse que a Virgin faliu; um árabe comprou o prédio por 440 milhões de euros, e que tinha a Fnac, que ainda vendia uns disquinhos, lá na Rue de Rennes. Dava pra ir a pé. Fui. Estava cansada, mas a vontade de ouvir Banga era maior.

Banga, o disco novo da Patti Smith. BANGA.

Eflúvio de primeira sensação. Desvirginação. Sou um bebê de 88. Quando comprava discos, era bem pirralha. Sempre foi emocionante, mas a emoção de abrir a janela pra sentir o jato de ar -- sem saber de onde vinha o jato de ar. Agora há o amadurecimento do jato de ar. É o cálculo ideal do sopro levantar os cabelos. 
Banga é o primeiro. O primeiro disco que aguardo, daquela grande artista que eternamente te canibaliza como uma imensa aranha peluda. E pêlos tem tudo a ver com Banga, com Patti. Pêlos e culhões. 

Sou uma capricorniana crítica como o mais branco dos anjos -- porque o diabo jamais será crítico, muito pelo contrário; o diabo é o sim absoluto. Não gosto de nada que escuto. Minto, até gosto, mas não me emociona, não me toca. Gosto de emoções profundas. Gosto que enfiem o dedo nas minhas entranhas. Gosto de não conseguir segurar lágrimas, gritos. Avalanche. Sou séria demais e preciso de emoções fortes a altura. Altas doses de qualquer coisa. Potência. É por isso que gosto do que gosto, e sou fiel ao que gosto. Gosto pra sempre. O homem que me toca, tocará para sempre (em alguma esfera). O disco que amo, amarei para sempre. Nem que o tempo passe, as coisas mudem, mas está santificado na minha capelinha. Erigir monumentos de pedra aos meus, é o que faço. Patti Smith tem sua estátua lá, de turmalina negra onde os cabelos emendam as roupas e vê-se o nariz saltado sugando todo o ar desse mundo.

E Banga, oh, BANGA. What the fuck is banga? Sei que haverá uma história, e que vou suspirar com ela. A isso chama-se confiança.

Gosto de gente que possa confiar.

Entro na Fnac e os auto-falantes avisam que está prestes a fechar. Corro, literalmente, tal qual uma fã de Justin Biber. Pergunto no meu francês de três anos de idade où est Banga?, où est Banga?????. Banga é um ferido de guerra, só o toco; braços e pernas implodidos pelas armas de Napoleão. De Banga só restou a boca. Ele não pode ir até mim. Eu preciso ir até ele. Desço dois andares e o encontro, numa pilha com outros bangas, quase da cor da estátua no meu altar. 17,99 euros, edição especial de lançamento, que acompanha livro. Patti é uma mulher digna de total confiança.

Folheio o livro em pura excitação. Descubro que Banga é, na verdade, um cachorro. Fecho o livro. São emoções que não consigo lidar agora. Só preciso ir pra casa, dormir, acordar, andar e, quando o céu permitir, botar o disco pra tocar. 

Demoro 48h para realizar o ato. 07/07. Não é o numeral, apenas a vontade.
Botei a mochila nas costas e saí pela cidade, lá pelas 15h30 da tarde. Chovia muito e fazia 17 graus no verão parisiense. Segui pela Rue de Tournon, que virou a Rue de Seine, e fui parar no rio Sena. Fotografei ralos triangulares, andei até o Musée D'Orsay, encostei o nariz nos Van Goghs e Gauguins. Pude sentir o cheiro da tinta. Curiosamente, depois fui ao banheiro e meu nariz sangrou -- o que é muito, muito raro. Fui expulsa de lá porque o museu precisava fechar, comprei um portentoso mapa de Paris e a Pariscope e o jornaleiro perguntou se eu era allemande e me chamou pra ver um filme. Ele foi tão educado que agradeci, expliquei que não seria possível devido a minhas configurações sentimentais, mas que merci beaucoup, e muita sorte na vida. Ele sorriu. A chuva apertou e resolvi voltar para casa por dentro das ruelas ao invés de seguir novamente o Sena. 
Essa é a hora. 
Enfiei Banga nos ouvidos e apenas caminhei. 

Amei o disco (e foda-se o que você pensa, com todo o respeito, porque freqüentemente eu me preocupo demais em não ofender os outros, principalmente na seara gosto, mas nesse caso eu realmente não quero saber, nem discutir). Chorei, chorei. Caralho. Pontadas no peito. E quando começou Banga, a faixa título, lágrimas corriam mais rápido do que pude segurar. Pensei no meu cachorro, no meu fido, pura confiança encarnada. Meu fido finado, cujas cinzas estão no mar. Loyalty rests in the heart of a dog/Don’t set all your eggs on the back of a frog, canta Patti. Loyalty lifts and we don’t know why/ And the paw is pressed against the nerve of the sky/ You can leave him behind but he won’t leave you/ And the road to Heaven is true – true blue. HEAVEN IS TRUE. Chorei como um lobo, rangendo os dentes.


BANGA IS A DOG.

Loyalty rests in the heart of a dog
Don’t set all your eggs on the back of a frog
You can lick it twice but it won’t lick you
And salivating salvation gone so long so
Loyalty lifts and we don’t know why
And the paw is pressed against the nerve of the sky
You can leave him behind but he won’t leave you
And the road to Heaven is true – true blue
Banga
Say Banga
Say
Loneliness lifts when you open the night
Pilate awaits, as Jesus Christ
Forget him not – won’t forget about you
The way to Heaven is blue – boo hoo
Say - Banga
Say - Banga
Loyalty shifts if you carry a load
Ah, don’t shit it out in a golden commode
You can kick him twice – it’ll erode
Night is a mongrel – believe or explode
On the lonely night
On a golden road
Night is a mongrel
Believe or explode

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