12/03/2012

Coisas que a gente não escreve na agenda

Perdi minha agenda.
Já procurei em todo lugar, e nem tem tanto lugar pra procurar. Depois de três voltas, constato que a perdi, pois não está nos lugares estabelecidos como possíveis. Impossível encontrá-la. A boca recém-operada pede dramaticamente preu não me abaixar mais uma vez, e parar de andar, senão eu vou inchar inchar inchar, e sangrar... por favor, pare. Então eu paro e sento. Ligo uma música, vou para o computador e fico pensando em tudo que está escrito nesse dia de segunda-feira que eu não vou fazer pois não achei a agenda. Faz parte da filosofia de viver um dia de cada vez -- eu nunca folheio a agenda pra saber o que há no dia seguinte. Nunca. Acordo cedinho, aí sim abro e vejo, ah! dentista!, assim não sofro por antecipação. A única coisa que sei que tem pra hoje é o primeiro dia de aula. Mais um primeiro dia de aula, pra quem achou que tinha acabado.
Não é de hoje que sofro por não ter completado a faculdade, então porque não? O momento pareceu propício. A vida desacelerou -- não andou pra trás, mas diminuiu marcha. Alguns vestibulares ainda rolavam, de repente eu faço e vejo no que dá, praquele curso lá que eu queria fazer mas não fiz na época e tem tudo a ver comigo. Me inscrevi, dois dias antes da cirurgia prestei o novo vestibular e dois dias após a cirurgia descobri que passei, mas que só abriram 3 vagas e, bem, corra.
Fui lá, cara inchada, desencavei o diploma, o histórico, e em poucos minutos estava matriculada no curso de Psicologia. Sim, senhores, sou a mais nova aluna de Psicologia e hoje é minha primeira aula.
Isso me faz refletir sobre o fato de todos os malucos analisados acabarem cursando Psicologia. Vai todo mundo parar lá. No meu caso, há dupla ambição: primeiro, angariar material de psiquê humana pra escrever; segundo, respaldo acadêmico pra atuar na área de terapias holísticas, um estudo já em andamento.
Pareceu plausível, racional e nem um pouco emocional, por isso acredito na decisão. Não vou pesá-la com expectativas de agenda, vou deixar o dia seguinte pro dia seguinte. Vou ser leve como a Estrela. Não consigo acessar a matrícula pra ver as aulas de hoje, mas tudo bem, chego lá mais cedo e resolvo isso. Quem sabe me acostumo um pouco com a sala de aula, assim ninguém verá o pavor diante dos meus olhos quando aquela porta se fechar. Tenho fobia acadêmica. Mas, ela há de passar, e minha nova auto-terapia inclui fazer tudo que dá pavor. Uma das coisas foi arrancar logo de uma vez os dois sisos que faltavam e que tanto me davam medo e problemas e dores de cabeça.

Eu preciso de símbolos pra funcionar, como se minha mente fosse uma engrenagem sombria daqueles jogos de RPG onde o personagem meio-homem-meio-animal precisa fazer brilhar o símbolo correto em cada parte para ela começar a girar. Eu precisava de um símbolo, um amuleto, que fizesse a roda continuar girando, pois ela estava meio parada (ou paralisada, de medo). Então marquei de arrancar os dois sisos, e o fiz, após 10 anos fugindo. Confiar um problema ao futuro é no mínimo perigoso, pois o futuro é agora e daqui a 3 segundos, e você será impiedosamente esmagado pelo que está empurrando até que decida acabar com aquilo de uma vez.

Vou entregar esses dois fósseis a alguém que possa transformá-los num colar. Serão meu amuleto, o amuleto da excisão, da remoção, da superação. Sombrio, como minha própria engrenagem interna.



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